domingo, 5 de dezembro de 2010

Quem fala a verdade...

Era um coronel de Artilharia muito distinto e educado, casado com uma senhora da aristocracia francesa e que tinha um fraco pela bebida. Contava-se que, quando morria alguém, aparecia no velório a distribuir copos de aguardente pelas mulheres que, a troco de dinheiro, velavam o morto pela noite fora. A certa altura tão bêbado estava ele como as carpideiras e acabava tudo em grande cantoria. Este oficial foi chamado ao Ministro da Guerra, que o aconselhou a ter melhor comportamento, sob pena de ser sujeito a processo disciplinar. Perfilado em frante do Ministro, ele respondeu:
- Pode V. Ex.ª congratular-se pelo facto de no exército português só haver dois bêbados: eu e V.Ex.ª.
Claro que teve que pedir a passagem à reforma...

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Pouca terra

A estação de caminho-de-ferro fica a 12km da minha cidade. Nos anos 30, um rapaz nosso vizinho pediu uma bicicleta emprestada e foi à estação ver o que nunca tinha visto: o comboio. Tinha 18 anos.

Isabéis

As minhas filhas ainda se lembram da minha tia Violante, pois não há muitos anos que nos deixou. Dizia ela, a nossa tia, que as miúdas faladoras, espertas e vivaças eram as chamadas "serigaitas". Foi este adjectivo que ela pôs à nossa Isabel I: a resposta na ponta da língua, a graça e um certo ar de delicioso atrevimento caracterizavam-na. Pois tem agora uma digna sucessora, com o mesmo à vontade e a graça dos três aninhos, uma autêntica "serigaita". Apenas as voz tem uma ou duas notas mais agudas...
A Isabel II segue-lhe os passos.

quarta-feira, 21 de julho de 2010

Um filme antigo

Ela tem no quintal as rosas mais lindas que floriram nesta Primavera/Verão. São de uma cor indefinida, uma mistura de amarelo, laranja, salmão e vermelho.
Posso dizer que nunca vi mais bonitas, se fossem a concurso ganhavam sem favor, tal como as rosas "Mrs. Miniver" no filme antigo, elas seriam as rosas "Mrs. Pires".

terça-feira, 13 de julho de 2010

A galinha gorda

Era um rapaz do campo, corado, moreno, de cabelo preto e encaracolado, cheio de vida e com a força dos 20 anos; estava a cumprir o serviço militar num batalhão de província e era impedido de um oficial, cuja família era, na altura, apenas composta por pai e filha adolescente.
Sempre bem disposto, costumava cantarolar no quintal as "saias" lá da aldeia:

Minha vida são castanhas
Cozidas com beldroegas
Eu a saber-te das manhas
E não sei pra que mas negas

Pai e filha comiam do restaurante, mas com o correr do tempo a comida tornou-se intragável, aquele menú sempre igual e a saber ao mesmo; dizia a filha que sabia a água da loiça.
Acabavam por jantar torradas, café com leite e alguma fruta. O jantar lá ia para o impedido, que depois de ter comido o rancho ainda conseguia engolir um segundo jantar inteirinho.
Engordou, este já de si corpulento rapaz. Brilhavam-lhe as faces coradas e os olhos, de um azul muito claro. Acabou o serviço militar, depediu-se e foi para a terra, a poucos quilómetros da cidade.
Passados alguns anos, apareceu em casa da jovem, entretanto já casada: trazia um cesto e lá dentro vinha uma grande e gorda galinha, com um ar tão saudável como ele.
-Trouxe a galinha para a menina comer, mais o seu marido. Andei a engordá-la, como a menina me engordou a mim. Que lhe faça bom proveito!

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Alguém sabe?

Alguém sabe que estes dias de Junho são os maiores do ano?
Alguém sabe que há luar todas as noites?
Alguém sabe que o planeta Marte aparece no céu de leste?
Alguém sabe que os jacarandás estão a florir?
Alguém sabe que os pardalitos pançudos poisam à tardinha na minha varanda?
Alguém sabe?
Eu sei, e isso me basta para ser feliz. Hoje!

quarta-feira, 26 de maio de 2010

O Republicano

Quando foi implantada a República em Portugal, o meu avô Manuel Roberto tinha 49 anos e era professor da instrução primária numa aldeia perto de Elvas. Convictamente republicano, participava nas reuniões feitas na farmácia, juntamente com o médico, o farmacêutico e mais um ou outro aderente à causa, reuniões clandestinas, à porta fechada, pela noite dentro. O seu emprego e a sua vida estiveram em risco, pois os esbirros (até numa pequena aldeia desconhecida os havia) denunciaram o professor e a sua família sofreu com isso. Também as famílias dos lavradores mais abastados deixaram de contar com ele para dar lições particulares aos seus filhos. Teve que fingir, parecer o que não era, mas a sua convicção permaneceu e, em 1910, pôde livremente festejar a vitória dos seus ideiais.
Homem honrado, íntegro e dono de um coração solidário, ele é para mim um símbolo e um herói. Neste ano do centenário da República é dele que me lembro, é a sua memória que está mais viva do que nunca.

terça-feira, 27 de abril de 2010

Coisas da Fernanda

A Fernanda fazia oito anitos e a Mãe disse-lhe para trazer a amiga e vizinha para lanchar com ela. À hora do lanche ela apareceu mas trazia com ela não só a amiga e vizinha, mas também toda a turma da 3ª classe.

terça-feira, 20 de abril de 2010

Alta Competição

O futebol arrasta multidões, desfaz amizades, ajuda políticos, enriquece jogadores, dirigentes e empresários e enlouquece os adeptos. É um fenómeno que poucos sabem explicar.
Há muitos anos, um jogo aparentemente sem importância fez tremer a minha pacata cidade: frente a frente iriam estar a equipa dos alunos do Liceu e a equipa dos alunos do Asilo.
O meu irmão, que era aluno do Liceu, encarregou-se de espalhar a novidade lá em casa e a emoção crescia à medida que o dia se aproximava. Eu queria que o Liceu ganhasse, claro.
O dia chegou e o Liceu ganhou. A claque do Asilo ficou furiosa, acusou o árbitro de favorecer o Liceu ( já nesse tempo o árbitro era ladrão e filho desta e daquela) e andou pelas ruas insultando os estudantes do Liceu e quem os apoiava. Fizeram até uns versos com muita piada:

O Liceu é um ladrão
Que roubou o campeonato
E se ele ganhou a taça
Foi à custa do Sr. Rato*

Essa taça está guardada
com muitas recordações
pois o Asilo foi jogar
com uma cambada de ladrões

Olha o Asilo a taça a ganhar
Mas veio o Liceu e tratou de a roubar
Olha o Asilo com a sua equipe
O liceu ganhou por ser da elite

Essa taça foi roubada
Ninguém sabe mas sei eu
Foi pela grande quadrilha
Dos que andam no Liceu

Para mim, tudo isto terminou muito mal. Algumas alunas da 4ª classe apanharam-me à saída da escola e, ao cimo da rua, deram-me uma tareia monumental, tudo porque pertencia à elite do Liceu.
Quem me manda a mim dar a conhecer as minhas preferências clubistas...

* O árbitro da partida.

domingo, 18 de abril de 2010

Os brincos, as mulheres e as vacas

Tinha um vestido preto, com gola e punhos brancos e um avental também branco, debruado a bordado inglês. Era muito novinha a Maria Antónia, acabada de sair da escola, duma aldeia ali bem perto. Quando recebeu o primeiro ordenado os pais vieram também e dizia o Pai, um homem forte e corado, que tinha sido nosso impedido:
- Com este dinheiro vamos comprar-lhe uns brincos. Cá no meu ver, uma mulher "desórelheda" é como uma vaca sem chocalho.

sábado, 17 de abril de 2010

A Verbena Azul

O baile era ao ar livre, numa quente noite de Verão. Um estrado e uma orquestra, uma orquestra completa, das antigas "bigbands" que abrilhantavam os bailes dos anos quarenta; tinha um reportório vasto e bem escolhido e tocava nessa altura uma canção francesa, "J'attendrais".
Ela de vestido branco drapeado, ele de fato castanho. Enlaçados e apaixonados, dançavam esquecidos do Mundo. Os outros pares tinham deixado de dançar para admirar aquele abraço ao som da música, de dois corações que se entendiam naquelas palavras da canção: "J'attendrais le jours et la nuit..."
Só deram que estavam noutro mundo quando as palmas irromperam, ela envergonhada, ele orgulhoso da sua namorada, a mais linda da cidade.
Foi no Pátio do Liceu, na "Verbena Azul".

quarta-feira, 7 de abril de 2010

Patatô

"Patatô" faz três anos
Três deliciosos aninhos,
Gordos, sorridentes e felizes.
"Patatô" porta-se bem
Quando não se porta mal...
Porque logo a seguir, logo, logo,
Ri, com os dentinhos certos e branquinhos.
"Patatô" alegra as nossas vidas
É uma bênção ter o "patatô"
Duda para toda a gente
"Patatô só para a
Avó

03/01/2010