segunda-feira, 4 de maio de 2009

Quim Mamão e C.ª

No velho prédio da rua em frente à minha, morava o vizinho "Bodanego", sapateiro de profissão. A oficina era esconsa, suja e com uns fundos misteriosos, que desafiavam a minha imaginação. Ora esse sapateiro tinha um filho, o Quim, que era especialista naquilo a que hoje se chamaria "prestação de serviços": electricistista, inventor, sapateiro, canalizador, investigador, cientista, organizador de eventos...
O Quim tinha um amigo, o Martinho, que com ele trabalhava nos tais fundos misteriosos da oficina. Ali experimentavam inventos, fabricavam pomadas e "pózinhos de perlim-pim-pim". A pomada era a famosa pomada "Estrela", que engraxava sapatos, polia móveis e até dava resultado nas dores reumáticas. Deslocavam-se a domicílio e o Quim algumas vezes consertou canos entupidos, avarias eléctricas e montou ratoeiras na minha casa. Pelo Carnaval, a dupla pregava partidas às pessoas que por ali passavam, vindas das freguesias mais distantes, atando notas de vinte escudos a um fio de coco que puxavam, quando alguém se baixava para as apanhar, entre grandes gargalhadas.
Para além de tudo isto, o Quim ajudava umas senhoras solteironas, feiotas e ricas, a fazer festas e bailes: contratava músicos (acordeonistas), encomendava a comida, contratava os criados de mesa, e depois da festa, ele próprio fazia a limpeza. A parte eléctrica da festa também era com ele: lâmpadas de maior voltagem, jogos de luzes na sala, enfim, tudo lhe saía das mãos e daquela cabeça imaginativa e louca. Às vezes rebentavam fusíveis e havia curto-circuitos, que geravam o pânico entre os convidados e as donas da casa, que imediatamente chamavam o Quim. O Quim, aliás, estava logo ali à esquina (era ele que desligava o quadro eléctrico que estava no patamar), pronto para salvar a festa.
O que é facto é que as duas senhoras arranjaram maridos nessas festas e o Quim muito contribuiu para isso.

1 comentário:

zira disse...

As pessoas, os vizinhos tinham de certo, um convivio diferente do de hoje. Todos se conheciam bem e isso era essencial.Ah!... Até parece que também eu ia a essas festas... até parece que oiço o acordeon...