segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Eleutério Barriguinhas Chambel

Nós tivemos um gato, amarelo e branco, que o meu primo Manel apanhou pequenino na estação do comboio e trouxe no bolso para nossa casa.
O gato depressa se fez um bichano gordo e simpático, e o meu irmão Lito tinha por ele um especial carinho, que, aliás, era recíproco. Apesar de ser muito reservado e tímido, o meu irmão ensinou ao gato uma série de habilidades que faziam as delícias dos nossos serões: saltava um fio posto a toda a largura de uma porta, fio esse que ia subindo em altura, tal como a fasquia do salto em altura; se não me engano, chegou aos 90 cm, o que, para um gato, era considerável. Também saltava pelo arco de bastidor (um círculo de madeira onde se punha um pano para bordar), chegando a saltar até por dentro de um aro metálico ao qual o meu irmão pegava fogo.
Por todas estas habilidades era conhecido, e a vizinhança em peso vinha ver os espectáculos do Eleutério, assim baptizado em homenagem a um atleta do Benfica. Tinha por apelido (o gato) Barriguinhas Chambel. O gato seguia o meu irmão por toda a parte e dormia à porta do quarto dele. Quando o Lito adoeceu, mudámos de casa, mas o Eleutério ficou muito habituado à antiga moradia, e fugia para lá muitas vezes. Depois, quando o Lito começou a piorar de dia para dia, o gato nunca mais saiu de casa. Na madrugada anterior à morte do meu irmão, o gato miou tão desesperadamente, que o nosso impedido agarrou nele e o levou para o quartel, onde o fechou numa arrecadação, com água e comida. À tarde mandei buscá-lo, mas o rapaz apareceu-me com lágrimas nos olhos: o bichano estava morto, tal e qual o dono, que tinha morrido às 9 e um quarto da manhã. Quem sabe se morreram à mesma hora do dia 21 de Julho de 1946...

1 comentário:

Isabel I disse...

Por estas e por outras é que eu cada vez gosto mais de animais e menos de pessoas. Estes, ao contrário daquelas, não nos traem, não nos esquecem e nunca nos desiludem. Isabel I